A realização do Sínodo para a Amazônia e agora com a Assembleia Eclesial Latino Americana e do Caribe, bem como a convocação do Sínodo Geral para outubro de 2021 até outubro de 2023, trouxe para mais perto de todo Povo de Deus o conceito de sinodalidade que o Papa Francisco está fazendo questão de resgatar. Por conta disso, boa parte dos que participam hoje da Igreja Católica, e até fora dela, sabem, no mínimo, que a palavra sínodo significa caminhar juntos. Mas para além do significado da palavra o que se pode compreender da intenção do Papa?
Setores católicos, mais por obediência do que por convicção, apressam-se em afirmar que se trata de buscar aprimorar os mecanismos de consulta de todos e todas (mulheres, nem tanto) que, de alguma forma, participam de instâncias eclesiais para ajudar no discernimento de quem deve decidir, isto é, a hierarquia. Porém, tal posição desqualifica o saber teológico tradicional da Igreja e coloca o Papa em uma posição um tanto quanto ingênua, o que não se pode admitir.
Tudo indica que existe a intenção de ampliar não somente a consulta, mas a participação efetiva no processo decisório, ainda que a hierarquia, naturalmente, mantenha o seu papel de guardiã da ortodoxia. Como indicava o meu professor de Direito Canônico, já falecido, Pe. Antônio Pereira, o sacramento da ordem não pode contradizer o sacramento do batismo. A eclesiologia, isto é, o que se pensa sobre o papel da Igreja, desenvolvida no Concílio Vaticano II através, sobretudo, do documento Lumen Gentium, Luz dos Povos, exige que se aprofunde a tradicional afirmação de Igreja como Povo de Deus, pois todo/a fiel é membro do Corpo Místico de Cristo.
Contudo, há fortes indícios que tal princípio, tão tradicional do Caminho de Jesus Cristo, desde Atos do Apóstolos, “«Os Apóstolos e os Anciãos, irmãos vossos, saúdam os irmãos de origem pagã residentes em Antioquia, na Síria e na Cilícia … Resolvemos, de comum acordo, escolher delegados para vo-los enviarmos … Eles vos transmitirão de viva voz as nossas decisões: O Espírito Santo e nós decidimos não vos impor mais nenhuma obrigação, além destas que são indispensáveis…»”. (At 15,23.25.28), não seja recepcionado com facilidade na atual conjuntura eclesial.
Tomar decisões de forma consensual, como preconiza a fé cristã entre irmãos e irmãs, vem se perdendo. Ficamos felizes, enquanto leigos e leigas, cremos que em outras instâncias mesmo enquanto presbíteros e religiosas, quando não somos tratados como súditos. O Papa Francisco vem usando conceitos que quando partiam do laicato eram vistos como agressão e não como uma avaliação do processo de tomada de decisão, como clericalismo e autorreferencialidade. Tal posição do Papa nos deixa muito contentes.
Precisamos, todo Povo de Deus, tomar o processo da reconstrução de uma Igreja Sinodal, pobre para os pobres, pelas mãos. Suspeitamos que qualquer tentativa para esvaziar este processo frustre tremendamente muitos e muitas que entenderam o valor do seu batismo. Suspeitamos que a voz da Igreja para o mundo seja cada vez mais relegada a uma fala espiritualista, o contrário de espiritual, se ela não for capaz de avaliar com profundidade os sinais dos tempos.
A hora é agora. As igrejas particulares, dioceses, precisam convocar os fiéis para participar do processo. Neste momento da Assembleia Eclesial Latino Americana e do Caribe e, a partir de 09 e 10 de outubro de 2021, do Sínodo Geral. Vamos aprofundar o legado da Vª Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e do Caribe realizada em Aparecida, e, sobretudo do Concílio Vaticano II. Que o Espírito Santo abra o caminho.